Monólogo ou Notas do subsolo (qualquer semelhança com Dostoiévski, é mera coincidência).


Quarto em Arles, por Vincent Van Gogh


Acho que não consigo mais escrever nem uma receita de bolo. Faz tanto tempo que eu não escrevo, que eu não leio um texto que não seja instrumental – é como denomino os textos acadêmicos do curso de Direito – , que parece até que eu não sei, que não consigo mais saborear a poesia que fica (ou ficava?) incrustada entre os parágrafos, com suas narrativas, suas tramas dos livros de aventura, terror – fossem tramas de romances policiais, ficção cientifica ou sei lá mais o que meu Deus!
Gostava de pensar que nós escrevemos para nos libertar do tédio, da repetição, da rotina, do mais do mesmo. Mas ai vem a realidade da vida, as obrigações, as angústias e frustrações. Essas coisas que vão tomando nossa vida aos poucos e que nos deixam sentimentais que nem o diabo. Tem dia que você pára  para pensar na vida, naqueles momentos bobos, quando, p. ex., o sinal fica vermelho e você vê os pedestres atravessando a faixa e vê, nesses desconhecidos, rostos, gestos, que não lhe parecem agora mais tão estranhos. Como se todos estivessem indo para algum lugar que você desconhece (e nem é da sua conta conhecer mesmo), mas que no final, não faz sentido algum, pois todos se dirigem para algum lugar ao mesmo tempo que parecem chegar a lugar nenhum.
Mas o que mais me intriga – é, estou deixando a escrita fluir, daqui a pouco começo a falar sobre o preço do barril de petróleo e a situação no Oriente Médio... – nessa história de escrever e gostar de escrever, é ter a certeza de que você escreve para ninguém ler. Ora, não que eu esteja me achando um gênio incompreendido e que a humanidade tem a obrigação de ler minhas coisas, mas é que isso, de escrever e ninguém ler, é algo deveras frustrante e que deixa a gente comovido que nem um pobre diabo. Escrevo nesse blog já faz um tempo –  desde 2014? É. O tempo voa – , e, de lá pra cá, gosto de pensar que minha escrita melhorou ou, então, que hoje eu já consigo me expressar bem melhor. Ernest Hemingway dizia que gostava de escrever porque era algo mais difícil, mais desafiador do que viver. Estou convencido de que esse pensamento procede. Mas se o leitor quer saber de algo, o que eu queria agora mesmo, era poder ler um romance em paz, deitado na cama, ouvindo um jazz – Miles Davis ou uma bossa nova ao som de Joe Passcomo fundo musical, e depois poder tirar um cochilo. Assim, o mundo pareceria ser mais amistoso, e as paredes do quarto pareceriam ser menos opressoras. Mas só queria mesmo, porque eu sei que isso é uma das coisas, dos prazeres simples da vida, que, sendo simples, acaba sendo difícil de vivenciar, e sendo difícil, é descomplicado... 




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