O valor da guerra e da paz - uma análise kelseniana.


“Em tempos de paz, o homem guerreiro se lança contra si mesmo” Além do bem e do mal, do filósofo Friedrich Wilhelm Nietzsche.

Guerra do Vietnã.

A "Guerra das trincheiras, a Primeira Grande Guerra (1914-1918).


“Tem-se afirmado que uma exigência comum a todos os sistemas de Moral seria: conservar a paz, não exercer a violência sobre ninguém. Mas já Heráclito ensinou que a guerra não só é “pai”, isto é, a origem de tudo, mas também o “rei”, isto é, a mais alta autoridade normativa, o mais alto valor, sendo, portanto, boa, que o Direito é luta, por isso, é justa. E até Jesus diz: ‘Eu não vim para trazer a paz à terra, mas a discórdia’; e, portanto, não proclama de forma alguma, pelo menos para a ordem moral deste mundo, a paz como o valor mais alto. Poderá negar-se que também hoje, segundo a convicção de muitos, a guerra como tem valor moral porque possibilita a comprovação das virtudes, a realização de ideias que se colocam em plano mais alçado que os valores da paz? Ou é porventura a moral do pacifismo uma moral indiscutida? Corresponde a filosofia da vida do liberalismo segundo a qual a competição, a luta da concorrência, garantem a melhor situação possível da sociedade, ao ideal da paz? Esse não representa de forma alguma para todos os sistemas de Moral o valor mais elevado, e para muitos nem sequer representa qualquer valor. E, mesmo que se pudesse determinar  um elemento comum a todos os sistemas morais até aqui vigentes, ainda assim não haveria  razão suficiente para não considerar  como Direito, uma ordem de coação que não contivesse aquele elemento e prescrevesse uma conduta que ainda não tivesse  sido considerada em qualquer comunidade, como boa ou justa, ou proibisse uma conduta que ainda não tivesse sido considerada em qualquer comunidade como má ou justa”. Direito e Moral, do livro Teoria Pura do Direito, de Hans Kelsen, p. 73. [1]
“A guerra é o pai de tudo e o rei de tudo. Ela demonstra que uns são deuses e os outros são homens; a uns torna ela escravos e a outros  homens livres”. É justo que na guerra os vencedores se tornem deuses ou homens livres, e os vencidos homens ou escravos. Com efeito: “O homem deve saber que a guerra é um princípio geral e o Direito é luta, e que tudo acontece com base na luta e na necessidade”. A Ética de Heráclito é uma espécie de doutrina do Direito natural: “A sabedoria consiste em dizer a verdade e agir de acordo com a natureza, perscrutando-a”. Do fato de a realidade da natureza mostrar a guerra e a luta como um fenômeno geral segue-se que a guerra e a luta são justas. [2]


Hans Kelsen.





[1] KELSEN, Hans, 1881-1973. Teoria Pura do Direito; tradução João Baptista Machado. – 8 ed. – São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2009.
[2] Idem, p. 406.









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