Anátema de Baais.


"The Ghost of a Flea", William Blake.


Havia um deus chamado Baais, que era solitário e pouco poderoso entre os outros deuses no panteão cósmico. Baais era um espírito de força ilimitada, mas  que mesmo assim sentia-se demasiado triste e inseguro. Durante as noites no vácuo do universo, quando contemplava o luar esverdeado do planeta de Gaal, onde residia, Baais almejou criar um mundo só para si. Tal mundo deveria ser belo e bem povoado. Então, do pensamento de Baais surgiu um par de indivíduos amorfos, admirado com sua criação, ele os denominou de Homem e Mulher. Para a massa fulgurante, que mais tarde transformou-se em Terra, Baais enviou suas criaturas e, por longas eras, tal qual sentinela, vigiou o desenrolar de sua criação.
Com o passar do tempo, os outros deuses, perguntaram-no: “Baais, tu tens andado absorto entre brumas incógnitas. O que um deus pode pensar além da completude?”. Em verdade, Baais, ao conceber a criação do Homem e da Mulher, também transferiu muito do seu poder àqueles, que outrora criara. E tal atitude, de criar vida e novos mundos, havia sido vedado aos deuses de menor estirpe, como era o caso de Baais. Baais sentiu medo e culpa.


Ilustração de Gustave Doré.

Então, por tempos indefinidos, Baais ocultou sua criação dos outros deuses até que, Silo, o deus das Hostes do Universo descobriu a Terra que Baais criara. Grande foi seu ódio, e triste foi a sanção aplicada sobre Baais.

Ilustração de Gustave Doré.

Disse Silo, no ímpeto da punição divina: “Tu criaste um abcesso na harmonia do universo. Transferiste o teu poder para seres ínfimos e mesquinhos. Portanto, como punição, verás tua criação ser corrompida pelo mesmo poder que tu usaste para criá-la". Baais, então foi ridicularizado pelos outros deuses e levado a uma sentença atroz.
Doravante, Baais foi expurgado do panteão dos deuses, e foi encarcerado numa cela chamada corpo. De carne e osso era seu cárcere, em um reles homem foi transformado, e assim foi exilado na terra.
Grande era seu ódio, agora que se encontrava na Terra, e por muitas vezes desferiu golpes contra o ar, amaldiçoando o firmamento.
Por aqueles tempos do expurgo de Baais, aTerra tornara-se um antro de homens nefastos e indolentes.
Ah, mas como muitas vezes desejou Baais morrer, pois muito o entristecia a má índole dos homens pela busca ilimitada de poder. Por séculos, vagando pelos reinos dos homens, vendo diferentes cores e formas, diferentes culturas que haviam brotado da sua mente, Baais viu que sua criação também podia ser bonita.
No entanto, havia a ânsia pelo poder no coração dos homens.
Como um deus não poderia prescindir sua imortalidade, Baais nunca envelhecia. Então, vendo o caos instaurado pelos homens com suas diferentes línguas, Baais usou seus poderes, agora já reduzidos, e criou uma imensa fortaleza para governar; erigiu uma imensa muralha, onde em suas quatro pontas construiu zigurates para vigiar seu reino das pretensões nefastas dos homens. Dali, da mais alta torre na fortaleza, estabeleceu seu trono e ficou a observar os rumos da raça humana.

Ilustração de Gustave Doré.

E como era mau o homem
Como era vil a riqueza
Triste fim estava fadado
Ao Ser na Terra.
Assim pensou Baais.
Guerras, ódio e ira moviam os homens

Havia um mal estar na civilização, pensou Baais.
E  então veio a noite.
Baais esperou, ansiosamente, o crepúsculo dos deuses.






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